
UNIVERSIDADE DO ESTADO DA BAHIA-UNEB
Departamento de Ciências Humanas- Campus IV
C.C:Estagio Curricular Supervisionado I
Professora: Ana Lúcia
Discente: Eliene Dias
Turma: 5º Semestre - Letras Vernáculas
MEMORIAL DE FORMAÇÃO
Não basta saber ler que 'Eva viu a uva'. É preciso compreender qual a posição que Eva ocupa no seu contexto social, quem trabalha para produzir a uva e quem lucra com esse trabalho.
Paulo Freire
INTRODUÇÃO
Elaborar um memorial de formação “quando os autores são apenas estudantes, o que se coloca como referencia principal é a condição de estudante e a reflexão sobre a prática inevitavelmente é de outra natureza, uma vez que ainda não ingressaram na profissão”.(PRADO;SOLIGO.)
Escrever é , parar , repensar, sair em busca de mim mesma,ressignificar na memória experiências vividas tanto no presente como no passado.Algumas dessas informações muitas vezes já esquecidas no tempo,por isso a tarefa exige muito, implicando na minha imersão,interior,ativando abertura de novas experiências e aprendizado , tendo a consciência de que a vida é um grande professor .
Pela primeira vez em minha vida escrevo um memorial sendo mais um aprendizado e experiência a narrar, pois estamos mais acostumados a narrar e refletir o outro , do que a nós mesmos. Um grande desafio, nada fácil e para mim.Impossível narrar minha história sem tomar distância no tempo e na memória,talvez se tornará até um desabafo ou uma carta no decorrer da escrita.
O mais marcante em minha vida é o Senhor em minha vida, pois está sempre do meu lado nos momentos bons e ruins,ensinando-me sempre a ser uma pessoa melhor .E ao seguir a profissão de professora para mim é um exemplo de amor ao próximo, pois é necessário amar o que faz e para quem faz e ser uma professora para mim é se doar todos os dias para melhor mediar o aluno no mundo e lutar cotidianamente pela valorização da profissão.
Agradeço a Deus todos os dias por ter posto meu pai em minha vida, mas Deus o levou assim que iniciei a graduação no ano de 2014.1,portanto, é muito recente ainda essa dor da perda em minha vida, ele era e é um herói para mim e um exemplo que tento seguir sempre na minha caminhada.
Não sou muito de falar sobre as dificuldades vividas, mas de relembrar como etapas, de aprendizagem e valorização de tudo que tenho hoje .Minhas experiências ruins fizeram –me crescer enquanto pessoa e as boas saber que Deus está sempre comigo me dando forças a seguir em frente .Chegar até aqui não foi nada fácil portanto, sei que tudo o que começo eu termino, claro se meu Pai do céu permitir.
QUEM SOU EU?
Eu sou Eliene Dias Bispo , nasci em 27/11/1981 na cidade de Campo Formoso Bahia, filha de Genice Dias neta de índia ,meu pai é Vivaldi Casseano descendente de negro .Residi em Campo Formoso apenas até 7 anos.À procura de uma vida mais digna meu pai decidiu irbuscar um lugar melhor para trabalhar e criar sua família, pois ali já não dava mais pra viver .Fomos morar em Cuiabá –MT, nessa época de luta e buscas de sonhos da minha família me faz imaginar ser um personagem da obra “Vidas secas “ de Graciliano Ramos .
Não foi fácil também no início em Cuiabá, muitas vezes vivíamos de ajuda principalmente roupas e materiais escolares, o pão de cada dia graças a Deus meu pai nunca deixou faltar .Recordo-me de uma professora chamada Leonilda que foi um anjo que Deus colocou em minha vida e de minha família, ela olhou uma aluna além da sala de aula me amando e ajudando com materiais escolares e roupas , eu a via além de apenas uma professora , uma amiga , uma mãe. Nunca faltou nada o que,comer , porém o salário do meu pai só dava pra alimentar eu a filha mais velha, meus dois irmãos e minha mãe, que logo em seguida começou a trabalhar também para ajudar.
Desde meus 8 anos já cuidava da casa e dos meus irmãos para meus pais trabalharem.Nunca tive tempo de ir além da sala de aula para aprofundar nos estudos , somente fazia as atividades de casa á noite quando minha mãe chegava do trabalho e pronto, nada mais além disso. Não fui uma criança dedicada à leitura, não conhecia livros de contos de fada, em nenhum momento da minha infância eu recordo de ter lido certos clássicos. Lembro pouco dos meus primeiros contatos com a leitura e a escrita.
Brincava muito pouco em virtude das obrigações serem maiores.As amizades que tenho hoje 100% foram adquiridas na escola e no local de trabalho. Enquanto morava em Cuiabá eu adorava escrever cartas para os familiares e amigos que moravam aqui na Bahia, gostava também de trocar mensagens poéticas com colegas de escola , mensagens que eram escritas em um caderno como se fosse um livro de poesias que eram guardadas como lembranças.Até hoje tenho uma agenda com algumas mensagens de amigos da escola.Lembro que o ambiente escolar sempre foi pra mim minha diversão, meu passatempo , como não tinha tempo de brincar nos recreios eu fazia a festa.
Hoje,já sou uma mulher casada e resido em Jacobina e tenho dois filhos.A necessidade de ajudar financeiramente e o sonho de casa própria me fez entrar no mercado de trabalho.Já exerci a função de babá, vendedora, recepcionista, coordenadora de visual merchandise, caixa, estoquista, entre outras.Em 2012 parei de trabalhar com o nascimento da minha filha.Já consegui minha casa própria , meu carro por meio do meu trabalho e agora quero ampliar meu aprendizado , meu currículo e ter uma perspectiva diferente para o futuro.
Ao recordar-me da vida escrevendo o memorial compreendi a convivência com meus pais .O meu pai foi o que mais me ensinou e incentivou a ser o que o sou hoje , amo minha mãe,mas talvez por tudo que ela passou, era muito depressiva exigia muito de mim no cuidado da casa e irmãos,muito sofrimento descarregado em mim, ensinado-me como mãe hoje, a não ser uma imitação dela com meus filhos . Algo que não aceito é culpar minha família de não influenciar-me a leitura, eles estudaram até a 4ª série e a situação foi a mesma em sala de aula na sua época ler apenas para decodificar e assinar o nome e na realidade a sobrevivência dos filhos era mais importante do que a leitura , não sabendo eles que verdadeira leitura nos fizesse olhar diferente .
Em todos os meus trabalhos sempre me dei bem com todos os colegas , seja colegas de trabalho ou patrões pois, faço o melhor de mim , seja qual for a profissão.Gosto muito de aprender , e me preocupo muito com o meu nome , sempre levo comigo o que meu pai (in memória ) dizia : “ A única coisa que um pobre e preto tem que preservar é o nome e o estudo é uma ferramenta para tudo melhorar .”Seja qual for a profissão sei que é necessário dedicação e amor no que faz ,sendo indispensável saber o que realmente é o meu papel na profissão que desempenho. Tenho certeza que se meu pai soubesse que a leitura fosse importante, ele falaria ao invés de estudo, leitura é uma ferramenta para tudo melhorar, a palavra é vida, conhecimento e libertação.
Com a profissão de professor não é diferente, é importante muita força de vontade, estar sempre aprendendo e conhecer seu aluno para melhor mediação , pois sabemos que nem todos aprendem da mesma forma . A formação leitora é algo muito importante ,mas não faz parte da maioria da história dos alunos, assim como na minha não fez,sendo um dos deveres mais importante do professor.O objetivo é que seja praticado na escola essa leitura prazerosa e reflexiva pois, o lugar que se deve iniciar esse prazer e formar leitores reflexivos precisa ser na escola .
Tudo na vida é um aprendizado, tudo na vida é reflexão, seja para melhorar ou piorar, por isso estou sempre tentado mudar para melhor.
EU A FAMILIA E A ESCOLA
Em 1988 ingressei com 6 anos de idade, minha vida estudantil na Escola na cidade de Campo Formoso , me recordo pouca coisa da escola e dos professores, mas lembro do fardamento listrado branco com azul , uma gravatinha vermelha , sapatinho preto com meia branca até o joelho não esqueço, parecia roupa de marinheiro,lindo.Porém só estudei a 1ªsérie , meu pai estava com dificuldade de sustentar a família , fomos morar em Cuiabá - MT, chegando lá tive que fazer a 1ª série novamente na “Escola Estadual Primeiro e Segundo Grau Antônio Epaminondas “ . O estudo iniciava apenas com 7 anos.Era tudo novo, escola ,cidade , casa foi muito interessante.Sempre gostei de estudar e meus pais sempre se preocuparam com os estudos e sempre dizia meu pai( in memória) a única coisa que posso dar é comida e os estudos, destacando sempre a importância de um pobre estudar para conseguir uma vida melhor.
Na segunda série, mudei de colégio novamente, meus pais moravam de aluguel e mudamos para distante da antiga escola , estreando outra história na Escola Estadual de I e II grau João Brienne de Camargo .Lá vivenciei uma história longa de 9 anos e foi neste local que cheguei conclui o ensino fundamental e médio.Sinto saudades dos amigos e professores que lá deixei.Sempre fui dedicada aos estudos e na maioria das vezes sempre notas boas , mas infelizmente não me recordo de ter lido obras literárias como algo prazeroso ou com olhar crítico sobre o tema abordado , só mesmo para saber os períodos e resumos prontos para avaliações.Leituras apenas como decodificação , copiar e colar em todas as disciplinas .
Em 1999 finalizei o ensino médio e em 2000 me casei e voltei para a Bahia porém não para Campo Formoso - BA e sim para Jacobina -BA , iniciando novamente os estudos em 2001 o ensino médio no Colégio Municipal Gilberto Dias Miranda ,pois gosto de estudar e achava não estar preparada para prestar o vestibular .No ensino médio senti alguma diferença porque li três livros" Vidas Secas "de Graciliano Ramos , "O Ateneu" de Raul Pompéia,"Os Miseráveis" de Victor Hugo, mas ainda não foi como leitor critico , mas já com um olhar um pouco diferente na interpretação que começava .Amei vidas secas e os miseráveis , mas o Ateneu foi muito complexa a compreensão.
No mês de Junho de 2004 já finalizando o ensino médio , nasceu meu primeiro filho Kéven Cassiano,.Para concluir o ensino médio, meu marido teve que olhá-lo durante a noite, e assim consegui terminar o que tinha começado, pois tudo que começo termino .A partir daí dei uma parada nos estudos para me dedicar á família e depois ao trabalho no comércio, para ajudar financeiramente no lar e realizar o sonho da casa própria.
Em 2012 nasceu meu segundo filho, uma menina chamada Kíria Cassiane , tendo então que parar de trabalhar , pois não tinha quem a olhasse.Como não gosto de ficar parada , quando ela completou 1 ano ,resolvi estudar no cursinho Universidade Para Todos(UPT), prestei o vestibular para Letras e fui aprovada .Começando então, a vida acadêmica no curso de Licenciatura em Letras-Língua Portuguesa e Literaturas, turma 2014.1 .Meu esposo teve que paternar cuidando da nossa filha para eu estudar ,sendo um grande incentivador e amigo, me ajudando nas horas mais difíceis .
EU E O INÍCIO DA VIDA ACADÊMICA
“Ninguém sabe tudo. Ninguém ignora tudo. Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre”. (PAULO FREIRE)
Em 2014.1 iniciei minha vida acadêmica tenho objetivo de terminar nos 4 anos e seguir os degraus que ainda têm por vir ,já estou no 5º semestre esta sendo uma experiência muito árdua e prazerosa ao mesmo tempo .Para mim entrar em uma universidade sempre foi algo muito distante, imaginei poucas vezes fazendo parte desse ambiente, por achar não capaz de passar no vestibular e continuar até o fim.
Mas hoje, dentro deste espaço sei o quanto perdi, por não ingressar assim que completei o ensino médio. Até o momento sei que estou ganhando muito aprendizado e muita experiência boa, querendo apenas agora recuperar o tempo perdido.
No 1º semestre me candidatei a uma vaga de estagiária na biblioteca do campus, e fui aprovada, trabalhei por 2 anos .E ao terminar o estágio fui chamada para trabalhar em outro setor no mesmo campus por uma empresa terceirizada .E sei que é apenas o inicio de muita coisa que vem pela frente , eu creio e farei por onde , estudando e me dedicando como sempre fiz , honestidade e caráter em primeiro lugar.
Esta sendo árduo para mim, por chegar à Universidade sem muita experiência no hábito de leitura, pois leitura em meu tempo de escola era apenas, decorar , copiar e colar , nada reflexivo, critico para compreender e explicar com minha ideais e palavras , tudo era o professor e o livro didático como correto , me prejudicando muito para um melhor desenvolvimento nos trabalhos acadêmicos , hoje .
Percebo que a maioria dos estudantes que tem o hábito de leitura a facilidade de compreender as teorias e obras analisadas é bem maior, a oralidade é mais adequada ao ambiente universitário e o senso crítico também e várias outras atividades realizados no meio acadêmico.
Prazerosa, porque percebi como é bom estudar, compreender e ler .Conhecer outro ambiente que estava distante da minha realidade, gratificante também adquirir novos amigos , professores e que professores sábios! Na verdade pra mim até agora esta sendo mais prazeroso do que árduo nessa nova etapa da minha vida já com 34 anos.
O conhecimento acadêmico é muito importante para nós futuros professores, sendo necessário ir além da prática ,o embasamento teórico é fundamental para um bom mediador, modificando assim o olhar reflexivo para si mesmo , melhorando a sua postura e exercendo seu papel com maior persuasão e fugindo do senso comum .È preciso no meio acadêmico sair consciente do verdadeiro papel do professor na educação.
Os ateliês, oficinas realizados por nós alunos, foi para mim muito emocionante e satisfatório e desafiador, como também esta sendo, para fazer esse memorial, tudo para mim novidade e aprendizado. Os cursos, simpósios, oficinas oferecidas pelo campus queria muito participa de todos, mas a correria do dia –a – dia não dá ,mas os poucos que participei me fizeram viajar em outro mundo se toda a comunidade de Jacobina e região soubessem e participassem destes eventos com certeza sairiam com um novo modo de olhar o mundo.
Quando me recordo que durante 10 a 13 anos de colégio só me recordo “ler” três obras e durante 2 anos de graduanda já li muitos entre eles : A hora da estrela de Clarice Lispector, O auto da compadecida de Ariano Suassuna ,O fantástico mistério de Feiurinha de Pedro Bandeira, Muito como um Rei de Fábio Mandingo, Entre rinhas de cachorros e porcos abatidos de Ana Paula Maia ,Os ratos de Dyonélio Machado e vários contos lidos em sala de aula entre outros e obras apresentadas por meio de seminários que posteriormente lerei com mais tranquilidade.
Na minha época escolar posso dizer que não tenho em minha memória um professor que me inspirou , mas da faculdade já tenho muitos que quero levar como exemplo para sala de aula e para a vida .
Iraides é uma das que me fez despertar pela leitura de uma forma tão especial , que já estou idealizando concluir a faculdade para ler várias obras literárias, mas ler por prazer ,compreender , refletir. Sua forma de lecionar, mediar nos motiva a estudar e ler, é um exemplo a seguir como professora e como leitora. Professora Geisa ,Lícia ,Denise ,Ana Lúcia ,Rúbia, Helga entre tantas só me fazem querer continuar e aprender muito mais , correr atrás do tempo perdido e ir a luta, pois nada se consegue fácil.
Até agora a maioria dos professores do campus IV serão exemplos para a minha vida, é percebível o amor no que faz, a paciência no ensinar e a sabedoria presente no falar. Eu sei que tenho muito de aprender e sei que estou no lugar certo e no curso certo, seja para exercer a profissão ou para ganhar uma enorme bagagem de conhecimento e aprendizado que levarei comigo, sempre.
Jacobina-Bahia
Outubro-2016


