
“Não há saber mais ou saber menos: há saberes diferentes”
Paulo Freire
Sou Luciana Alves dos Santos (Lucinha), nasci no dia 12 de março de 1980, na cidade de Jacobina- Bahia, filha Dalva Alves Barreto e Manoel João dos Santos, residentes no povoado Saracura distrito de Itapeipu, município de Jacobina. Meus pais tiveram oito filhos, e eu sou a sétima do casal. Sou casada com José Carlos desde 1997 e tenho uma filha que se chama Larissa.
Passei minha infância na zona rural (Saracura), morando com meus pais e meus sete irmãos. Foi lá que iniciei o percurso da minha formação educacional. Ainda muito nova, antes dos sete anos comecei a ir para a escola, na época, era a cartilha e não podia matricular criança que não tinha sete anos de idade, mesmo assim por eu ser sobrinha da professora, ela aceitou que eu ficasse “encostada”, fui alfabetizada por ela, mas não podia ir para a primeira série porque não tinha a idade certa, esse fato ocorreu mais ou menos no ano de 1985, só após dois anos que fui matriculada na cartilha.
Venho de uma família em que, alguns são professores, minha irmã mais velha, Telma Simoni foi a minha professora da cartilha, a qual era professora leiga, minha tia Maria Barreto foi minha professora da 1ª e 2ª séries, também professora leiga, e um primo Derosci Barreto foi o meu professor da 3ª e 4ª séries, o qual não era formado em magistério, porém em contabilidade. Todo o meu ensino do fundamental I (antigo primário) foi em escola multisseriado na Escola Antônio Martins de Oliveira, os alunos sentavam em bancos de madeira, três em cada um (fato ocorrido até a 2ª série) a partir daí, já na 3ª série era cadeira individual, era um quadro negro pequeno, e o (a) professor (a) dividia-o marcando com o giz e ficava um lado para cada série, à sala de aula também era dividida ao meio, sendo um lado para cada série. Sempre fui uma ótima aluna, tirava boas notas e nunca fiquei em recuperação.
Aprendi a ler e a escrever da forma tradicional, primeiro aprendia as vogais, depois as consoantes e, a partir daí formavam as famílias de cada letra. Até a 2ª série não tinha livro individual só havia o livro do professor, a partir da 3ª série é que se ganhava livro de alguma disciplina. Foram ótimos professores, mesmo sem nenhuma formação no magistério, com as práticas e as experiências vividas por eles em sala de aula com a diversidade que havia, esses professores aprenderam ensinando, e os alunos também aprendiam com eles.
Atualmente, Telma já não exerce a profissão docente, está na área da saúde, Maria cursou o pró-leigo e hoje já está aposentada e Derosci formou-se em magistério, geografia e educação física e ainda exerce a docência.
Tenho muita saudade da minha infância, mesmo com toda dificuldade que vivíamos, éramos felizes, brincávamos muito, juntamente com meus irmãos e meus amigos, na hora do recreio tinham muitas brincadeiras (boleado, bandeirinha, futebol, amarelinha, capitão, pular corda...). Meu material didático era comprado, não ganhava nada, por isso era muito bem cuidado e valorizado. O respeito aos professores e aos funcionários da escola era de extrema importância , quando a diretora chegava à escola, os alunos levantavam e batiam palmas, isso contribuiu muito para a minha formação pessoal e educacional com muita ética e respeito às pessoas. Eu gostava muito de ler todo papel escrito que encontrava revistas, livros, não por obrigação, mas pelo desejo de ter um bom desenvolvimento na leitura, por prazer. Logo, toda a minha trajetória educacional do primário até o ensino médio, tudo era decorado, não aprendi a analisar e nem a ter criticidade, não foi desenvolvido essa habilidade em mim.
Quando iniciei o fundamental II em 1992, da antiga 5ª e 7ª série, o colégio já era em outro município, andávamos a pé 3 km, eu, meus irmãos e alguns colegas, na época não havia transporte disponível, por morarmos no município de Jacobina, e o colégio que estudávamos pertence ao município de Serrolândia. Mesmo com tantos desafios, foi uma época maravilhosa com boas recordações, não havia tanto perigo, nem tanta violência, não importava a distância que andávamos , era sempre com alegria e um prazer de ir à busca de um sonho de um dia poder conseguir chegar ao ensino médio e concluí-lo, que era a minha única perspectiva. Estudei da 5ª a 7ª série no Colégio Professora Edineide Cordeiro Araújo, situado em Salamin município de Serrolândia. Em 1995, estudei a 8ª série no Colégio Felicidade de Jesus Magalhães em Jacobina. Foi no fundamental II que me despertou o gostar de português, por influência da professora Madalena do Colégio Edineide, ela era maravilhosa, a sua maneira de ensinar me fez gostar da disciplina e com isso eu fui sentindo o desejo de um dia também ser uma professora da língua portuguesa.
Logo após concluir a 8ª série, em 1996 fui morar em São Paulo com meu pai e cinco dos meus irmãos os quais já moravam lá. Foi lá que iniciei meu ensino médio, fiz o 1º e 2º colegial (assim era chamado em São Paulo), aqui na Bahia chama-se formação geral. Logo no início tive dificuldades pela fonologia, os sons das vogais /e/ e /o/ por eles falarem fechados e nós baianos falarmos o som dessas vogais abertas, para mim, os paulistas eram quem falavam errados e para eles, eu falava os sons dessas vogais erradas, mas com o passar do tempo fui me acostumando ao som deles. Só aqui na Universidade através da disciplina Estudos fonéticos e fonológicos que entendi que cada falante tem o seu sistema de som da fala da sua própria língua, e não existe o falar certo ou errado, cada estado tem o seu sotaque diferente.
No final do 2º colegial, em 1997, engravidei com 17 anos de idade, quando minha filha nasceu, em 1998 tive que parar de estudar, só após dois anos do seu nascimento, retornei aos estudos. No ano de 2000, já estava morando na Bahia, comecei a fazer o 3º ano do ensino médio de formação geral, no Colégio Estadual de Serrolândia.
Agora, já morando em Salamin município de Serrolândia, não havia ensino médio nessa localidade, somente na sede do município, o nosso trajeto era em cima de um carro aberto uma C 10, quando chovia o dono do carro cobria-o com lona para não molhar os alunos e era no turno noturno, passávamos muito frio, eu tinha muito medo por ser carro aberto, e não havia nenhuma segurança. O desejo de concluí o ensino médio era maior de qualquer desafio encontrado, e venci todos esses obstáculos, e em 2000, realizei esse sonho.
Quando concluí o ensino médio, não tinha nenhuma perspectiva de algum dia entrar na faculdade, por causa da minha condição de vida, não tinha emprego, por morar em outra cidade distante onde o Campus Universitário está situado, o transporte custava muito caro para ir todos os dias e não havia condições nenhuma de pagá-lo e de manter os custos.
Mas, logo após concluir o ensino médio, passaram-se alguns meses, no ano de 2001, prestei concurso para prefeitura de Jacobina na função de agente de portaria, e passei em primeiro lugar. Alguns anos depois prestei vestibular para o curso de geografia, não porque seria a área que queria, mas porque seria no horário noturno pelo fato de já trabalhar no diurno, no entanto, não fui aprovada. Desisti por alguns anos de prestar outro vestibular, com 14 anos depois que havia concluído o ensino médio, resolvi prestar o vestibular para o curso de letras, que é a área que mais me identifico, e fui aprovada em primeiro lugar. Quando me escrevi para fazer esse curso, imaginava que nele teria mais disciplinas de linguística e de gramática, entretanto, o curso em seu currículo é ofertado mais disciplinas de literatura e também estudar a história da língua e suas modificações. Mas, está sendo muito bom para a minha formação educacional é através do curso de letras que estou conhecendo a história de nossa língua mãe e tendo conhecimento de nova forma de ver a literatura como conhecimento de mundo, e a partir dela aprendendo a ter análise crítica.
O meu olhar pela literatura era algo que não havia nenhum sentido para a vida, porque o que estudei no ensino básico era somente a história da literatura, as suas escolas literárias, e para mim aquilo não faria nem um sentido no mundo lá fora, não usaria em nada. Hoje tenho um novo olhar sobre essa disciplina, à literatura é uma maneira de mostrar a realidade. Segundo Ruth Rocha, “a literatura é o veículo que usa para expressar perplexidade, para expressar desejos, para expressar indignações, faz isso através da literatura”.
Eu estou no curso de letras para ser professora, pretendo ensinar nas escolas de ensino fundamental II e médio, ainda não trabalhei em sala de aula, não tenho nenhuma experiência docente, sabemos que os dilemas são grandes, alunos que querem aprender outros não, trabalho em escola com a função de merendeira e percebo as dificuldades desses dilemas dos professores, que não é nada fácil lidar com alunos que não tem interesse em aprender.
Ainda não me sinto segura para está em sala de aula, pela falta de experiência, me sinto despreparada para planejar e ensinar. Mas me apego ao que diz Maria Ghisleny de Paiva Brasil “isso porque enfatiza que o professor pode produzir conhecimento a partir da prática, desde que na investigação, reflita intencionalmente sobre ela, problematizando os resultados obtidos com o suporte da teoria. E, portanto, como pesquisador de sua própria prática”. E que esse suporte que estou tendo na teoria, ele venha se concretizar na minha formação de professora no dia a dia em sala de aula, que é o melhor lugar para aprender e não somente o lugar de ensinar. Cabe-me acreditar que posso ser capaz de novos saberes com a prática do fazer docente, quero ir à busca de novas experiências e de novos saberes, a educação não é estática é um processo contínuo.

